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quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Um casaco...



Sempre que olhava essa foto sentia uma dor enorme! Eu tinha doze anos quando o Andy se mudou pra Alemanha. Eu o idolatrava, ele era tudo pra mim, mas tinha ido embora. Vi que ele tinha esquecido esse casaco que usava direto. Era preto com bandeirinha da Alemanha no braço. Resolvi ficar com ele. Tinha o cheiro dele no tecido e por um bom tempo foi a minha melhor companhia.
Vez ou outra eu usava o casaco em casa, indignada e irritada porque o perfume dele se perdia no ar com o tempo, assim como ficava úmido com as minhas lágrimas. Vestir aquela peça me fazia sentir que eu o abraçava. Eu fechava os olhos e imaginava meu irmão perto de mim. Eu não queria estar sozinha, eu queria estar com ele, eu precisava dele.
Um dia, depois de uma briga com meu pai, saí na rua sem notar que ainda usava o casaco de Andy. Só percebi quando vi que estava sendo seguida por três garotos e uma garota. Eles deviam ter dezessete anos, ela uns quinze. Eu tinha dezesseis, mas era tão magra que ninguém imaginaria que eu era mais velha que ela.
Eu usava uma calça jeans surrada, um tênis mais ou menos legal e carregava uma mochila, que tinha meu lanche, alguns cadernos, roupas, carteira, pen drives e a câmera que eu usava pra trabalhar. Entrei em pânico quando os vi e acelerei o passo, até que comecei a correr e eles também. Uma tentativa inútil. Os garotos corriam muito mais que eu e em pouco tempo me puxaram pelo cabelo e eu caí. Riam da cena, pareciam querer um show e foi exatamente o que tiveram. Um deles tratou logo de tirar meu tênis, o outro arrancou a mochila de mim. Eu ficava mais desesperada a cada instante.
Eles poderiam tirar qualquer coisa de mim.. Menos a lembrança mais concreta que eu tinha do Andy! Foi besteira minha pensar que eles não iriam querer tirar isso de mim também. Eu chorava e riam mais ainda, dizendo que aquilo não era roupa de menina. "Deve ter sido a moeda de troca dela, depois de dar pra algum cara!!", "Olha isso, tem uma foto no bolso!!", "Quem é esse?! É com ele que você vai pra cama, sua porca?!".
As vozes deles não saem da minha cabeça até hoje, muito menos a cena de um deles rasgando a foto do Andy, enquanto o outro vestia o casaco. Com raiva, me levantei tentando arrancar o casaco de volta, mas obviamente não consegui, me empurraram de novo e eu torci o pé.
Depois que eles foram embora, resolvi ficar no estacionamento de um hospital. Era coberto e relativamente seguro. Acho que fiquei uns três dias escondida lá. Nem a fome, nem o frio, nem a sede me deixavam pior do que imaginar algo que era do Andy nas mãos deles... e longe de mim.